Wednesday, May 23, 2007


41.
Abandonar todos os deveres, ainda os que nos não exigem, repudiar todos os
lares, ainda os que não foram nossos, viver do impreciso e do vestígio, entre
grandes púrpuras de loucura, e rendas falsas de majestades sonhadas... Ser
qualquer coisa que não sinta o pesar de chuva externa, nem a mágoa da vacuidade íntima... Errar sem alma nem pensamento, sensação sem si-mesma, por estrada contornando montanhas, por vales sumidos entre encostas íngremes, longínquo, imerso e fatal...
Perder-se entre paisagens como quadros. Não-ser a longe e cores...

Livro do desassossego - Fernando Pessoa